quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Texto - Uma visão criminológica da Atuação da Polícia: Criminalização Secundária e Estigmatização



UMA VISÃO CRIMINOLÓGICA DA ATUAÇÃO DA POLÍCIA
CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA E ESTIGMATIZAÇÃO

Por Luis Felipe Vidal Arellano e Thiago Stuchi Reis de Oliveira

“Quem não dá pão ao faminto
Quer a violência
Quem na canoa não tem
Lugar para os que se afogam
Não tem compaixão.
Quem não sabe de ajuda
Que se cale.”

(Bertolt Brecht1)

Não é possível se discutir a atuação da Polícia Federal, ou de qualquer órgão policial, sem antes esclarecer a aplicação de alguns conceitos desenvolvidos pela criminologia nas últimas décadas do século XX e que ainda hoje são de central relevância no estudo do sistema criminal em todo o mundo. Neste sentido, destacam-se as idéias de “criminalização secundária” e “estigmatização”, que apresentaremos sob a perspectiva da labeling approach, conforme desenvolvido por Howard Becker2.

O controle penal ocorre sempre por meio de duas esferas: controle informal e controle formal. O primeiro consiste no controle formado por instâncias sociais de pressão difusa como a família, os grupos de interesses, a religião, o trabalho, etc. Por outro lado, o controle formal é desempenhado por órgãos do Estado, com a atuação do Ministério Público, Justiça Criminal e órgãos de execução criminal, além da especial participação dos órgãos policiais3.

Segundo a teoria do etiquetamento (labeling approach), o crime é gerado pela sociedade por meio de um processo de criminalização que passa por três fases: (i) criminalização primária – voltada à criação das regras relativas às condutas consideradas como criminosas; (ii) criminalização secundária – voltada à aplicação das regras sobre os indivíduos; e, (iii) impacto da criminalização sobre a identidade do “delinqüente”. Neste contexto teórico, a polícia se destaca como instrumento de criminalização secundária, selecionando os indivíduos que supostamente tenham praticado atos criminalizados primariamente, submetendo-os ao sistema de justiça criminal4.

Ocorre, contudo, que o processo de criminalização raramente ocorre de maneira equilibrada, havendo uma seletividade do sistema penal com relação a alguns indivíduos, tendo em vista sua etnia, classe social, gênero, idade, entre outros fatores. Isto pode ser percebido desde a fase de criminalização primária, na qual é visível a iniciativa de “instigadores da moral” que, a partir de códigos próprios de bondade e maldade, tentam obter apoio de grupos sociais e meios de comunicação, criando um clima de opinião favorável a seus objetivos5. No entanto, é na fase de criminalização secundária que a seletividade do sistema penal mais contribui para formação do estereótipo do delinqüente, reforçando a estigmatização e a própria seletividade do sistema. Nas palavras de Marina Grosner6:

“Com inegável violação ao princípio da igualdade, a criminalização secundária, em regra, seleciona primeiramente a prática de fatos de detecção mais fácil, ‘a obra tosca da criminalidade’ ... e as pessoas que causem menos problemas, em termos de acesso ao poder político e econômico. Esses selecionados serão considerados os únicos delitos e os únicos delinqüentes, alimentando um estereótipo no senso comum, com componentes de classe social, etnia, idade, gênero e até aparência estética, que acaba por se tornar o principal critério seletivo da criminalização secundária.”

Estabelecidas essas premissas teóricas, passamos à discussão da atuação, não somente da Polícia Federal, mas também de outros órgãos policiais que atuam no país. Isto se faz ainda mais necessário se considerarmos que a maior parte dos delitos não são reprimidos e investigados pela Polícia Federal, mas sim pelas polícias militar e civil dos estados, o que faz da atuação destes órgãos um problema, ao menos quantitativamente, ainda maior7.

A realidade dos nossos dias revela um enorme poder de intromissão das polícias nas vidas dos cidadãos, especialmente nas vidas daqueles que se enquadram no “estereótipo do delinqüente”, conforme apresentado acima pela teoria do etiquetamento8. Como exemplos deste tipo de poder, temos os inúmeros casos de condenação fundadas exclusivamente em testemunhos de policiais que efetuaram as prisões ou em elementos obtidos em sede de inquérito policial, usualmente sem qualquer respeito ao contraditório9. Da mesma forma, revela-se como reforço ao estigma social decorrente do etiquetamento do indivíduo como delinqüente a utilização de algemas por cidadãos que muitas vezes nem acusados formalmente foram e não oferecem qualquer risco de fuga ou resistência, ou a exposição de suspeitos diante de câmeras de televisão para serem as imagens transmitidas a toda a população, falseando uma sensação de eficiência do trabalho policial e de segurança da sociedade.

Portanto, a análise da atuação dos órgãos policiais deve necessariamente passar pela discussão de em que medida as práticas correntes contribuem para um reforço dos estereótipos existentes e usualmente injustos, pois contribuem para que um cidadão tenha maiores ou menores chances de ser encaminhado ao sistema penal, sofrendo todos os efeitos da estigmatização daí decorrente10.

Que não se diga, nesta ordem de considerações, que a Polícia Federal é modelo de atuação, visto que se dirige igualmente aos chamados criminosos de “colarinho branco”11. Isto, pois a seleção de indivíduos inicialmente invulneráveis ao sistema criminal é também um fenômeno estudado pela criminologia. Novamente nas palavras de Grosner, “por fim, há a seleção de pessoas que eram invulneráveis ao poder punitivo, mas que sofrem, excepcionalmente, uma ruptura nessa vulnerabilidade, numa luta de poder hegemônico em que saiam derrotadas.”12

Além disso, também a eficiência das “espetaculares” operações é posta em xeque quando contrastado o número de presos cautelarmente no curso das operações com o número infimamente menor de condenados definitivamente após o final do processo. O mesmo pode ser dito cotejando o número de prisões preventivas e temporárias concedidas por juízes de primeiro grau no curso das operações e que são revogadas pelos tribunais. Como exemplo, citamos a Operação Kayabi, realizada no final de 2006, sobretudo no Mato Grosso. Dos mais de 100 investigados que tiveram a prisão decretada cautelarmente na deflagração dessa operação, todos conseguiram a sua revogação pelo TRF da 1ª Região poucos dias após, demonstrando o colegiado que as prisões eram inicialmente desnecessárias e arbitrárias13, revelando-se o constrangimento ilegal presente na estigmatização dos envolvidos perante a sociedade.

Deste modo, é imprescindível refletir a respeito do papel das polícias no Brasil, tendo em vista os reflexos nefastos de sua atuação na realidade, diante dos dados apresentados pela criminologia atual. Essa reflexão passa pelo seguinte questionamento: queremos verdadeiramente que a polícia seja um órgão de preservação do status quo, selecionando os já marginalizados da sociedade e estigmatizando-os com a etiqueta de criminosos; ou desejamos que ela seja um instrumento eficiente na expansão da democracia? Caso decidamos por fechar os olhos para esta necessidade de mudanças, teremos que aceitar no futuro discutir novamente amordaçados os limites do Estado diante dos indivíduos, como já o fizemos em tempos funestos de nossa história. Este é um perigo real e iminente, sendo necessário lembrar as palavras do escritor americano Willian Falkner: “O passado não morre nunca. Não é sequer passado”.

1 BRECHT, Bertolt. “Quem não sabe de ajuda”, In Poemas, trad. port. Paulo César Souza, 3a ed., São Paulo, Brasiliense, 1987, p. 85.
2 BECKER, Howard. Los extraños – sociología de la desviacíon, Buenos Aires, Tiempo Contemporáneo, 1971.
3 CASTILHO, Ela Wieko V. de. O controle penal nos crimes contra o sistema financeiro nacional (Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986), Belo Horizonte, Del Rey, 2001, pp. 39-43.
4 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito penal brasileiro: primeiro volume – Teoria geral do direito penal, 2a ed., Rio de Janeiro, Revan, 2003, p. 43. “[a criminalização secundária] é a ação punitiva exercida sobre pessoas concretas, que acontece quando as agências policiais detectam uma pessoa que supõe-se tenha praticado certo ato criminalizado primariamente, a investigam, em alguns casos privam-na de sua liberdade de ir e vir, submetem-na à agência judicial, que legitima tais iniciativas e admite um processo”
5 BECKER, Howard. op. cit., p. 134-135. Quanto a este ponto, convém lembrar a participação da novelista Glória Perez na campanha de mobilização que resultou na introdução do crime de homicídio qualificado no rol de crimes considerados hediondos, ou o empenho de apresentadores de programas televisivos vespertinos em exigir das “autoridades” providências “duras” contra os criminosos.
6 GROSNER, Marina Quezado. A seletividade do sistema penal na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – o trancamento da criminalização secundária por decisões em habeas corpus, São Paulo, IBCCRIM, 2008, p. 51.
7 Evidentemente, não descartamos e efeito “midiádico” da Polícia Federal, o que faz com que ela seja o foco do debate, não somente nesta semana de palestras do Centro Acadêmico “XI de Agosto”, mas também nos jornais e mesas redondas em todo o país.
8 BARATA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal – introdução à sociologia do direito penal, 3a ed., trad. port. Juarez Cirino dos Santos, Rio de Janeiro, Revan, 2002, p. 86. “o status social de delinqüente pressupõe, necessariamente, o efeito da atividade das instâncias oficiais de controle social da delinqüência, enquanto não adquire este status aquele que, apesar de ter realizado o mesmo comportamento punível, não é alcançado, todavia, pela ação daquelas instâncias.”
9 Neste ponto, cumpre chamar atenção à nova redação do art. 155 do Código de Processo Penal, dada pela Lei nº 11.690/08, em sede da Reforma do Código de Processo Penal. Infelizmente, a redação conferida ao artigo em suas “andanças” pelo Congresso Nacional terminou por permitir a continuidade da infeliz realidade de decisões fundadas principalmente em elementos informativos contidos nos inquéritos policiais produzidos sem a máxima expressão do contraditório e da ampla defesa. A mesma posição foi sustentada pelo Prof. Marcos Coelho Zilli, em evento sobre a Reforma do Processo Penal, realizado pelo Grupo Paradigma em 13.06.08, na Sala dos Estudantes, e pelo Secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay, em conversa pessoal no dia 01.07.08.
10 AMAR, Ayush Morad. “Estigma e estereótipo – abordagem interacionista”, In Temas de criminologia, v. II, São Paulo, Resenha Universitária, 1982, p. 75. “Podemos definir o estigma social como atributo derrogatório imputado à imagem social de um indivíduo ou grupo e visto como instrumento de controle social. Dessa maneira, o estigma pode ser instrumento de estereotipia dos delinqüentes e desviantes, bem como gerador de ulterior delinqüência e “deviance”.
11 Para conceito de criminoso de “colarinho branco”, v. SUTHERLAND, Edwin H. Il crimine dei colletti bianchi, trad. it. Gabrio Forti, Milano, Giuffrè, 1987.
12 GROSNER, Marina Quezado. op. cit., p. 51-52.
13 As prisões desrespeitavam garantias constitucionais dos cidadãos acusados, como o princípio da individualização da pena, além de gerarem situações nitidamente configuradoras de bis in idem. Nas ordens de prisão dos acusados, dadas pelo juiz federal Julier Sebastião da Silva, da 1ª Vara Federal/MT, chegou-se a falar em “prisão para averiguação” dos investigados, algo absolutamente execrável em um Estado de Direito, o que, somado a irregularidades nas investigações policiais (ora, uma ordem de prisão absurda só poderia se basear em investigações também falhas que, por sua vez, são motivo suficiente para a revogação das prisões. Nesse sentido, se a Polícia Federal é eficiente nas prisões, é também nas solturas), levou o referido tribunal a revogá-las, estendendo tal decisão aos investigados que não haviam ingressado com habeas corpus. Vide http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=272874&edicao=11679&anterior=1.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Cartaz - Aniversário XI de Agosto


Parabéns!

XI de Agosto é o aniversário de nosso Centro Acadêmico. No assoprar de suas velas, desejamos que ele se torne:
COMUNICATIVO – próximo de seus associados, procurando atingir seus interesses, por meio da colaboração e incentivo para suas iniciativas. Que destine uma especial atenção ao que o aluno deseja discutir. É antes de tudo respeitar o aluno nos seus interesses.

INOVADOR – que tenha compromisso com o novo, buscando soluções diferentes para velhos problemas de nossa entidade. Sem medo de ser original, pensando e agindo de modo distinto. Há muito a se criar.

PRAGMÁTICO – que vá além do mero discurso, do lugar comum. Que saiba coordenar suas ações e mobilizar os alunos, a fim de obter mudanças efetivas. Que acorde dos sonhos em que as palavras bonitas e as promessas vazias são suficientes para mudar o mundo.

CORAJOSO – capaz de se posicionar, assumir responsabilidades. Ousar fazer e pensar, mostrando a que veio. Que faça com que seus associados sintam, e há muito não sentem, orgulho de seus feitos e conquistas.

A concretização desse desejo é o nosso objetivo.

GRUPO PARADIGMA

Ofício 16 - Dúvidas prestação de contas de Abril e Maio de 2008 e resposta ofícios antigos.


OFÍCIO Nº 16/08

São Paulo, 11 de agosto de 2008.

Ao
Ilmos.
Tesoureiros do Centro Acadêmico XI de Agosto,

O Grupo Paradigma requer, perante a Diretoria do Centro Acadêmico XI de Agosto, os seguintes esclarecimentos relativos às prestações de contas dos meses de abril e maio de 2008:

Porque novamente deixou de constar nos relatórios os saldos das contas do CA como conta corrente, conta investimentos, estoque de mercadorias, e etc?

A quais gastos especificamente se referem os R$ 20.060,17 incluídos sob a rubrica “logística”, entre as despesas relacionadas ao Congresso sobre o Código de Processo Civil, realizado em abril?

Em que consiste exatamente o gasto de R$ 100,00 descrito como “I-Phone”, realizado em maio de 2008?

O Grupo Paradigma novamente aproveita a ocasião para requisitar a autorização para ter acesso às notas fiscais e ao Livro Caixa do CA, com especial relevância para os documentos relativos à execução dos congressos e da peruada noturna, bem como demandar resposta ao pedido de explicação apresentado no Ofício de nº 13 e 14.

Atenciosamente,

Vítor Monteiro
Grupo Paradigma

domingo, 10 de agosto de 2008

Ofício 15 - Requerimento Cota de Xérox - Agosto 2008


OFÍCIO Nº. 15/08

São Paulo, 10 de agosto de 2008.

Ao
Ilmo.
Tesoureiro do Centro Acadêmico XI de Agosto,

O Grupo Paradigma requer, como grupo político organizado da Faculdade, a concessão pela Diretoria do C.A. XI de Agosto de Cota de Xérox referente ao mês de Agosto de 2008.

A fim de atender ao solicitado pela Diretoria do C.A. XI de Agosto, segundo o Informe Eletrônico nº. 10 de 31 de março de 2008, faz responsável pelas cotas destinadas ao Grupo Paradigma, o aluno Vítor Monteiro, Nº. USP: 5441593.

Atenciosamente,

Vítor Monteiro
Grupo Paradigma

 

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