Evento "O Fim do Senado"
17 de setembro de 2009, 10:00, Pátio das Arcadas
As discussões políticas raramente colocam em relevo o fato de que a Democracia, antes de ser um sistema político, é um valor, ou seja, um conceito constitutivamente aberto mas que pode ser apurado mediante sua prática. O valor democrático consiste na valorização do dissenso, ou seja, na assunção prévia da multiplicidade de pontos de vista acerca de um determinado objeto. Enquanto a democracia para os antigos consistia numa forma de governo, em que se valorizava a intervenção popular no preenchimento dos cargos públicos, a democracia para os modernos consiste na valorização do dissenso na tomada das decisões coletivamente vinculantes[1]. Todavia, a intervenção de toda a população na tomada de tais decisões mostra-se, se não impraticável, ao menos indesejável. Um dos graves inconvenientes da "democracia total" é a desvalorização do conteúdo do ato político a que inevitavelmente tal grau de participação popular poderia trazer (N. BOBBIO). A técnica encontrada pelas modernas democracias para possibilitar o efetivo exercício de atividade política pela população sem a inviabilidade numérica de um sistema de sufrágio universal nem a desconsideração material do ato de participação política foram os Parlamentos. Nestes espaços, indivíduos especialmente eleitos (investidos nos cargos mediante um mandato de direito público partidário) representam politicamente seus eleitores. A periodicidade das eleições compele os eleitos a agirem, em alguns aspectos de sua atividade, de acordo com as aspirações de seus eleitores[2]. Nossa Constituição, imbuída do ideário democrático (art.1°, caput), prevê a existência de uma Casa parlamentar destinada especificamente á representação da população: a Câmara dos Deputados (art. 45). Todavia, pela opção política irreversível pela forma federal de Estado que | também fez (art. 60, §4°, I), o Constituinte originário previu uma segunda Casa representativa: o Senado Federal, cuja função é a de representação dos Estados e do Distrito Federal que compõem a Federação (artigo 46). Não são de hoje críticas até mesmo à conveniência de um Parlamento. Há que defenda a chamada democracia direta, em preferência à representativa; há quem defenda o fim do Legislativo, constatando as benesses do exercício da função normativa pelo Executivo. E há quem defenda a existência de apenas uma Casa parlamentar, representando unicamente a população, não os Estados-Membros[3]. Estas discussões têm em comum o fato de reconhecerem a peculiaridade da atividade legislativa. Esta peculiaridade é tamanha a ponto de a teoria da separação de Poderes (funções estatais) ter conferido a função a diferentes órgãos estatais, ponto que parece ser desconsiderado por muitos. Outro ponto preguiçosamente deixado de lado é a valorização da própria atividade legislativa: muito mais fácil que fortalecer a lei em toda a sociedade é eliminar os órgãos por ela formalmente responsáveis. Todavia, democracia continua sendo a admissão prévia de discussão de todos os possíveis pontos de vista, razão pela qual deve-se discutir o papel do Parlamento, seja ele uno ou cindido, e mesmo a conveniência de sua existência. Mas não se deve deixar de lado o fato de que a construção dos Parlamentos representa uma conquista histórica que não pode ser deixada de lado unicamente pelas inconveniências mostradas pela casuística brasileira. Deve-se trazer à discussão, também, o fato de que o Senado é instituição inerente ao Federalismo que, como já apontado, é opção política irreversível do Constituinte originário. Discussão densa e difícil, mas com resultados certamente mais frutíferos do que a indolência liricamente retratada por Mário de Andrade em seu "Macunaíma". Aline Vaciski Gallassi - Turma 178, área II |
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